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Destro, o “herói anticomunista”, tem financiamento aberto para ganhar um jogo

O ano é 2043. Os governos do mundo sucumbiram ao comunismo. Apenas um único homem será capaz de trazer a liberdade conservadora – seja lá o que isso quer dizer – de volta ao país: Destro!

Se você tem mais de 30 anos, provavelmente esse foi algum enredo ruim de filme oitentista em que um brucutu, munido de uma arma de fogo, luta contra um exército sozinho e que você assistiu na Sessão da Tarde, correto?! Bom, pode ser que sim. Mas retornando ao Brasil de 2021, esse também é o enredo de Destro the Game, um game NADA POLÍTICO. Por que correr e matar uma horda de bonequinhos pixelados não pode ser político. É apenas diversão garantida em que você assume o papel do arauto do status quo, que apertou 17 em uma urna eletrônica e usa um visual lumberjack muito caído.

No papel de Destro, um super mega justiceiro que tem a lei nas suas mãos e pode cometer as maiores atrocidades, você irá caçar membros do exército comunista para salvar o Brasil dessa enorme ameaça.

Puxa! Que original! Nunca vi isso em lugar algum.

Vamos fazer um exercício de imaginação aqui. Acompanhe meu raciocínio: neste game, tudo usa Metal Slug como base: a construção de cenários, de investidas dos inimigos, o uso de veículos de combate. Se você jogou Metal Slug, sabe que nossos heróis lá, lutam principalmente contra um exército que lembra muito o exército nazista – por suas vestimentas, símbolos, bandeiras e por querer derrubar os governos mundiais e instaurar um regime totalitário comandado por seu general.

Mas voltando ao exercício: imagine que ao invés de jogar com um dos heróis que lutam contra esse regime fascista, você assumisse o papel do fascista?! O exército de um homem só, que leva sua pistola na mão, sua bandeira do Brasil puída em torno do pescoço e que tem o mesmo carisma de uma água de salsicha busca reviver o “passado glorioso” que nunca existiu. O discurso no qual boa parte da extrema-direita usa, de que “nos tempos do governo Militar é que as coisas funcionavam”.

É isso que o personagem criado pelo autor Luciano Cunha traz: um discurso reacionário, inflamado e fascista. Tanto que isso lhe custou seu posto na antiga editora, tendo que apelar para o velho truque do self-made man (vou falar em inglês por que eles acham chique demais), abrindo sua própria editora, já que as demais, ao que tudo indica, tiveram o bom senso de que tudo ali é fraco e potencialmente esvazia não só o discurso crítico, mas a cabeça de quem lê.

Apostando em um financiamento coletivo (Ué?! Mas isso não é meio que esquerdismo?!), Cunha aposta na potência reacionária e manobrista da comunidade gamer. Não é de hoje que vemos jogadores alinhados com o discurso do presidente (ou seja, completamente fora da realidade e falando coisas vindas diretamente de algum sub-fórum do 4chan, ditas por alguém de 12 anos), pouco reflexivo e carregado de preconceitos, misoginia e todo o “pack do reacinha”.

Talvez a melhor parte desse financiamento sejam os títulos de quem apoia. Quem doar apenas R$25,00 (ou seja, meio saco de arroz de 5kg) será Isentão, e apenas ganhará acesso ao jogo. Ou seja: se você é pobre, além de estar gastando nesse produto de qualidade duvidosa, ainda recebe uma zoada por ajudar “apenas” com meia-onça. Já outra nomenclatura viaja na ideia matrixiana (lembrando que saímos dos brucutus dos anos 80 e caímos aqui). Chamada de Red Pill, dando a ideia de que “apenas a direita sabe a verdade. Que o inimigo vermelho esconde a verdade mas que, ao tomar a pílula, toda a verdade salta aos olhos”, como na icônica cena entre Neo e Morpheus.

 

(Na verdade o personagem tomou a pílula azul por problemas de disfunção, caiu no sono e delirou toda essa ciranda).

Talvez a mais absurda seja a chamada O Capital, que pede ao contribuinte nada menos que CINCO MIL REAIS. Aqui, você pode provar que é um MESTRE DO CAPITALISMO, como o Anão de Embú da Artes, vestir sua cartola, colocar os carros em um terreno baldio… e ir pra casa jogar um joguinho bem meia-boca.

Em suma, Destro é apenas uma cópia cara de Metal Slug que tenta colocar os comunistas como vilões. Um discursinho chocho, capenga, manco, anêmico, frágil e inconsistente e que já foi desgastado devido ao seu uso frequente. Afinal, se ser comunista é ser contra essa ideologia que eclodiu em 2018, mas foi chocada por anos e anos passados, e que prega um lugar mais igual, com menos desigualdade e que todos possam ter as mesmas oportunidades, sim… eu sou um dos que estão levando bala de um personagem genérico em uma cópia “séria” de Metal Slug.

Destro não parece se entender como jogo. Ou como HQ, ou como o que quer que seja. Ele parece ser aquele tipo de obra que não pode se dar ao luxo de tirar sarro de si. Ele tem que ser “sério”, mas é sempre reduzido ao que ele é: uma cópia nada original de um jogo de sucesso e com carisma e que soube explorar bem isso, de seus heróis e inimigos.

Agora resta saber: será que o gamer que reclama de política nos joguinhos, vai reclamar desse aqui também, ou esse atende exatamente as expectativas do que ele não condena como “política em games”? Pois, seu principal personagem, O Doutrinador, após a queda de Dilma Rousseff, deixou de caçar os políticos corruptos para fazer justiça contra “o vírus vermelho chinês”. Será que os personagens desenvolvidos por Cunha caçarão os atuais governantes do país, após os escândalos envolvendo compras de vacinas e crimes ambientais de “lavagem” de madeira?

Fazer uma propaganda anticomunista é fácil. Difícil é explicar porque nesse futuro se mata rato na base do tiro.

Vinícius Vidal Rosa

Ex-técnico em informática, jornalista formado e apaixonado por games e tecnologia. Faz do seu tempo livre, uma maneira de levar informação e falar sobre o que gosta.

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Vinícius Vidal Rosa

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